No dia seguinte à posse do novo presidente do Supremo
Tribunal Federal, Ministro Dias Toffoli, circulou na imprensa e nas redes
sociais um vídeo do ministro recém empossado na festa promovida por entidades
de juízes. Circundado por três mulheres e outros convidados, o ministro da
suprema corte brasileira aparece com o microfone na mão cantando a música
“Tempo perdido” da banda Legião Urbana. Debruçado sobre o ombro da mulher à sua
esquerda e com a fala meio arrastada, o ministro parecia “distante de tudo”,
como diz a letra da música....
Um estrangeiro ou um alienígena certamente ficaria chocado
com as imagens. Já seria um escândalo um juiz de direito meter-se a cantar em
karaokês em festa regada a bebidas alcóolicas no clube da cidade onde exerce a
judicatura. Mas a moda parece que pegou mesmo no Brasil... Recentemente, circulou
um vídeo da ministra Carmen Lúcia, na época também presidente do STF, entoando
um sambão com a cantora Alcione, a Procurador-Geral da República e outras
ilustres convidadas de um seminário promovido pelo Conselho Nacional de Justiça.
Menos mal que estavam só entre mulheres e todas aparentemente sóbrias...
A conduta do ministro Dias Toffoli não é um ato criminoso.
Tampouco existe proibição expressa de magistrados cantarem em público. Não se
trata disso. Apenas espera-se um comportamento mais discreto de um ministro da
mais alta corte do país, responsável por julgar as contendas mais importantes
da nação. Ressalte-se que o ministro não estava cantando em uma festa familiar
e sim em um evento muito concorrido e sabidamente coberto pela grande mídia.
Inclusive, os vídeos mostram alguns celulares filmando a cena, de modo que o
ministro sabia que a sua performance fatalmente teria ampla publicidade. E
pouco importa se fosse particular, já que o estatuto da magistratura impõe aos
juízes o dever de manter conduta irrepreensível na vida pública e privada. Ora,
ninguém é obrigado a ser juiz. Mas, quando faz essa escolha, está ciente de que
o seu comportamento, público e privado, está sujeito a restrições. É como a
mulher de César: não basta ser, tem que parecer. E quando o ministro aparece
nas redes sociais daquele jeito não é crível que muitas pessoas o reconheçam
como ministro do STF. Pior ainda se reconhecerem, pois seria a prova de que a
imagem do Supremo foi mesmo para o brejo.
Mas alguém aí está surpreso?
Até hoje não se compreende como Dias Toffoli virou ministro
da suprema corte. Diz a Constituição que um ministro deve ter notável saber
jurídico e reputação ilibada. Está lá no ignorado art. 101 da dita carta cidadã.
Bem, reputação ilibada até pode ser subjetivo, a depender do caráter de quem
julga. Mas notável saber jurídico é um critério bem mais objetivo. Supõe-se que
não basta ser bacharel em Direito, do contrário o requisito seria ter diploma
de qualquer dessas faculdadezinhas de Direito espalhadas nos rincões do Brasil.
Também não basta ser sapiente nas coisas das lei. É preciso que esse saber
jurídico seja notável. O dicionário ensina que notável é algo digno de nota, de
atenção, que merece louvor, de grande importância, extraordinário! Veja-se:
extraordinário! Qual era a notabilidade do saber jurídico de Dias Toffoli? Não
se sabe até hoje... Tratava-se um renomado professor? Não. Quem sabe um jurista
reconhecido por obras prestigiadas no meio acadêmico? Tampouco. Então, ele já
era mestre, doutor ou Phd por alguma universidade? Nada. Das mais de 60 páginas
do seu currículo disponível na página do STF colhe-se uma única formação
acadêmica: bacharel em Direito. Como profissional foi um notório advogado do
Partido dos Trabalhadores, o que certamente lhe rendeu a oportunidade de ocupar
alguns cargos públicos, dentre os quais o mais proeminente foi Advogado-Geral
da União (AGU) no governo do ex-presidente Lula, hoje condenado e preso por
corrupção e lavagem de dinheiro. Até virar ministro de estado, não tinha nenhuma
obra jurídica publicada. No mais, sabe-se também que tentou ser juiz de
carreira, mas foi reprovado no concurso um par de vezes.
Apesar disso, virou juiz da mais alta corte do país e, pelos
próximos dois anos, será o seu presidente. Se já não preenchia o requisito
fundamental para ser ministro, imagina se teria outros predicados não exigidos,
como a máxima discrição. A cantoria na festa de posse não deveria ser surpresa
para ninguém.