sexta-feira, 17 de agosto de 2018
O país de mentirinha
Nessa semana, encerrou-se o prazo para os pretensos candidatos a cargos públicos nas eleições de outubro registrarem os pedidos de candidatura nos tribunais eleitorais. E o Partido dos Trabalhadores pediu o registro da candidatura de Lula à presidência, mesmo absolutamente consciente de que o seu líder não pode ser candidato, pois foi condenado criminalmente por órgão colegiado da justiça, no caso o Tribunal Regional Federal.
Já é assente que Lula não pode ser candidato, pois a Lei da Ficha Limpa veda a candidatura a cargos eletivos de pessoas condenadas criminalmente em segunda instância. (Um parêntese para explicar aos estrangeiros que foi necessária uma lei para impedir os brasileiros de elegerem e reelegeram por livre e espontânea vontade candidatos corruptos.) Pode-se até discutir se a condenação de Lula foi justa ou injusta, se havia ou não provas, se lhe foi garantido ou não o direito de defesa no curso da ação penal. É indiscutível, porém, que ele foi condenado criminalmente em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro. O seu julgamento foi transmitido ao vivo pelas emissoras de rádio e de TV para o mundo inteiro. Este fato é inconteste. E é igualmente indiscutível que a lei veda a candidatura de qualquer pessoa nessa condição. Está lá escrito no art. 1º, inciso I, alínea "e", itens 1 e 6, da Lei Complementar n. 64/1990. Trata-se de uma norma de clareza solar, como dizem os juristas. Não há zona cinzenta. É preto ou branco!
Mas é claro que no Brasil tudo é passível de discussão. Ninguém acha nada claro, especialmente as nossas autoridades. Como tudo é discutível, nada é levado a sério.
A ideia dos correligionários de Lula é tentar tapear a justiça eleitoral apresentando as certidões criminais expedidas apenas pela justiça do domicílio do candidato, que, no caso, é cidade de São Bernardo do Campo, no estado de São Paulo. Como a sua condenação é originária do Paraná, a certidão do juízo paulista é negativa. Não sendo do conhecimento do juiz eleitoral a condição de condenado, fica-se na dependência do Ministério Público, de um partido político ou de outro candidato formular uma impugnação noticiando a condição ficha-suja, momento em que se instaura o devido processo legal para se oportunizar a defesa do candidato impugnado.
Porém, no caso de Lula, a sua condenação criminal é fato público e notório. Até os macacos da Amazônia e os jacarés do Pantanal sabem disso. Segundo uma das regras mais comezinhas do processo civil, os fatos públicos e notórios não precisam ser provados. Logo, os Ministros do Tribunal Superior Eleitoral não podem fingir que desconhecem essa obviedade. O que se esperava que fosse feito? Tratando-se de um fato público e notório e considerando-se que a regra é clara, como diz o Arnaldo, era natural que a pretensão de Lula fosse sumariamente rechaçada. A coisa poderia ser resolvida em um parágrafo contendo um silogismo básico: pessoas condenadas criminalmente por órgão colegiado não podem ser candidatas; Lula foi condenado criminalmente pelo Tribunal Regional Federal; logo, Lula não pode ser candidato. Registro negado. Fim da história. Simples assim.
Natural em um país sério. Não no Brasil. Aqui, espera-se uma impugnação, concede-se prazo para a defesa, ouve-se o Ministério Público, realiza-se instrução processual, faz-se julgamentos e blábláblá... Tudo isso para, ao final, chegar-se à conclusão que todo mundo - ministros, advogados, partidos, correligionários e até o próprio candidato - já conhece: Lula não pode concorrer à presidência e a nenhum outro cargo eletivo.
O circo montado em torno do registro da candidatura de Lula é mais um espetáculo farsesco para uma população perplexa diante de autoridades simplesmente incapazes de agirem frente ao óbvio. Trata-se de mais uma prova de que o Brasil é um país de mentirinha.
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