quarta-feira, 20 de maio de 2015
O direito de greve no serviço público
Nessa semana, a greve dos professores da rede estadual de ensino de Santa Catarina completará 60 dias. Tanto tempo de paralisação é um convite para se refletir sobre o direito de greve dos servidores públicos e as consequências que o exercício desse direito deve acarretar.
O direito de greve está assegurado na Constituição Federal, tanto para os trabalhadores da iniciativa privada (art. 9º), quanto para os do setor público (art. 37, VII), portanto ninguém discute a legitimidade do seu exercício. Porém, nenhum direito é absoluto. Nem mesmo o direito à vida é absoluto, já que a própria Constituição autoriza a aplicação da pena de morte em pelo menos uma hipótese: quando houver guerra declarada. Em relação ao direito de greve, a Constituição também limita o seu exercício e sujeita às penas da lei quem fizer uso abusivo desse direito (art. 9º, § 2º). Na seara pública, o exercício do direito de greve ainda não foi regulamentado por lei específica, mas o Supremo Tribunal Federal há muito reconheceu a aplicação, por analogia, da Lei 7.783/1989, que regula a greve dos empregados privados.
A greve, por definição, consiste na suspensão coletiva, temporária e pacífica, da prestação do serviço ao empregador. Se o trabalhador, por livre e espontânea vontade, resolve não prestar o serviço para o qual foi contratado, qual é a consequência óbvia dessa decisão? Ora, parece intuitivo que, suspendendo-se o contrato de trabalho, suspende-se as obrigações de ambos os contraentes, empregador e empregado. Logo, a primeira providência que o empregador poderia adotar é cessar o pagamento do salário dos trabalhadores grevistas, afinal, o cidadão não pode ser remunerado sem trabalhar, pois isso seria um evidente enriquecimento sem causa. Compreende-se que nenhum empregador adotará tal medida imediatamente, ou seja, antes de tentar negociar o atendimento das reivindicações dos trabalhadores grevistas. Agora, paciência tem limite.
A greve dos professores estaduais de Santa Catarina logo vai completar 60 dias. Nesse período, as negociações avançaram a passos de tartaruga. Pode-se até admitir que os professores continuem de braços cruzados. O que não se compreende é o governo simplesmente não reagir, como se o movimento paredista não o atingisse. De fato, só os estudantes são atingidos diretamente pela greve dos professores. Mas o Governo tem uma responsabilidade, que é garantir aos alunos a carga horária mínima de ensino definida pelo Ministério da Educação. Eis aí um problema de difícil solução: considerando-se o calendário acadêmico, a reposição integral dos dias parados exigiria que os professores trabalhassem praticamente todos os sábados e domingos até quase o final do ano ou todos os dias do recesso escolar de verão. Alguém acredita que isso irá realmente acontecer? O signatário estudou em universidade pública e sabe muito bem como essas reposições só acontecem no papel. Quer dizer, o tempo de paralisação já gera prejuízos irreparáveis para os alunos da rede estadual.
Diante desse quadro, é justo continuar remunerando regularmente os professores grevistas? É justo deixar essa lacuna no ensino dos alunos da rede pública, aprofundando ainda mais o fosso existente entre as escolas públicas e privadas? No Poder Judiciário, o Presidente do Tribunal de Justiça Catarinense decidiu suspender parcialmente o pagamento dos salários dos servidores grevistas. Igual medida não deveria ser adotada pelo Poder Executivo? Não seria o caso também de se contratar professores temporários para tentar amenizar o prejuízo resultante da falta dos professores efetivos?
Uma lição aprendida nos primeiros dias de aula na Faculdade de Direito é que o direito de alguém termina onde começa o de outro. Ninguém duvida da legitimidade de algumas das reivindicações dos professores. O direito de greve deve ser respeitado, mas igualmente merece respeito o direito dos alunos de terem aulas. Em um Estado Democrático de Direito, como ainda é o Brasil, não se pode admitir que alguém exerça qualquer direito de modo abusivo e sem ser responsabilizado de alguma forma por isso. Quem quer desfrutar de um direito, precisa aprender a suportar também as consequências naturais advindas desse exercício. Como se diz, quem aufere o bônus, há de suportar o ônus.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirProfessor.. tenho pais e inclusive eu sou grevista... o que me diz sobre esse documento:
ResponderExcluirAcesse:
Lei de Greve nº 7783/1989 LDB 9.394/1996
Da Redação
Em 2007, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL reconheceu o DIREITO DE GREVE dos servidores públicos, que já estava inclusive previsto na Constituição de 1988. Neste sentido, em caso de paralisações do funcionalismo, o STF determinou que deve ser aplicada a LEI 7.783, de 1989, que regulamenta as greves dos trabalhadores da iniciativa privada. Ora, essa Lei, em parte alguma, diz que, especificamente, docentes têm que repor dias parados em caso de movimentos grevistas. Portanto, a cultura disseminada de que professores têm que repor dias de greve não passa mesmo de cultura, criada dentro dos PRÓPRIOS movimentos de docentes, na maioria das vezes para tranquilizar alunos de escolas públicas e seus familiares. A LEI 7.783 não trata disso. Não há, assim, ilegalidade em não repor.
A LDB e os duzentos dias letivos
A LDB 9.394/1996 diz em seu Artigo 24 que "a carga horária mínima anual será de oitocentas horas, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar".
E diz em seu artigo Art. 13 que "Os docentes incumbir-se-ão de ministrar os dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional.
Ora, cumprir os duzentos dias letivos é responsabilidade do poder público. Ele é quem tem que oferecer as condições adequadas e necessárias para que essa prerrogativa seja de fato posta em prática. Na atual conjuntura, onde prefeitos e governadores se negam a cumprir uma LEI Federal (11.738/2008), e desviam os recursos oriundos dessa Legislação para outros fins que não os da Educação Pública, por que obrigar os professores a repor aulas de greves provocadas pela irresponsabilidade de autoridades que estão à frente dos estados e municípios?
Quanto ao Art. 13, ele é claro quando diz que "os docentes incumbir-se-ão de ministrar os dias letivos". Mas essa tarefa deve ser cumprida em períodos de normalidade, e greve é um período atípico em qualquer área laboral, pública ou privada.
Assim, se prefeitos e/ou governadores descumprem leis e induzem professores a greves, eles é quem devem contratar docentes substitutos para, em horários alternativos (sábados, por exemplo), fazer com que os duzentos dias letivos sejam devidamente efetivados.
É necessário que os sindicatos de luta e independentes de governos e patrões comecem a fazer essa discussão com suas bases. Milhares de docentes em todo o país fogem de greves por conta das reposições de aulas que são obrigados a cumprir durante longos e longos finais de semana.
Caro Marcos, tudo bem se não quiserem repor. Nesse caso, só não podem receber o salário pelos dias parados.
Excluir