A operação Lava Jato desencadeou, na última semana, a prisão de mais um petista, dessa vez o senador da República Delcídio do Amaral, e do banqueiro André Esteves, do banco BTG Pactual. O significado dessas prisões ainda não foi compreendido em toda a sua extensão. É preciso ter uma perspectiva histórica para entender que, finalmente, no Brasil a Justiça é para todos.
O fato de prender um senador em pleno exercício do mandato já seria algo extraordinário, porquanto esse é um dos cargos mais influentes da nação, rivalizando talvez com ministro de estado e só perdendo em prestígio e poder para os Presidentes da Câmara e do próprio Senado e, é claro, o Presidente da República. Mas Delcídio do Amaral não é um "simples" senador ou, como se diz, um político do baixo clero. Não! Delcídio do Amaral era nada menos do que o líder do governo no Congresso Nacional, governo esse que ocupa o poder central há mais de 12 anos, o mais longevo da história democrática do país. Portanto, além de estar em pleno exercício do mandato de senador, é seguramente um dos políticos mais influentes do partido na atualidade. Finalmente, a sua prisão não foi decretada por um juiz de primeira instância, geralmente jovem, vanguardista e habituado a decisões que surpreendem pelo ineditismo e coragem. Não! A prisão do senador foi decretada por unanimidade pelos ministros da segunda turma do Supremo Tribunal Federal, corte essa que, até bem pouco tempo atrás, jamais tinha condenado criminalmente um político em ação originária. Para completar, o senador foi acompanhado no camburão por um banqueiro.
Mesmo assim, ainda há quem observe a prisão do senador e do banqueiro desacreditando o trabalho do Ministério Público e do Poder Judiciário. Alguns chegaram a desdenhar a decisão, afirmando que os poderosos continuam soltos. Ora, mais poderoso que um senador só mesmo os Presidentes da Câmara, do Senado e da República. Desses, um já foi denunciado pelo Ministério Público, o Presidente da Câmara Eduardo Cunha, por corrupção e lavagem de dinheiro. Outro, o presidente do Senado Renan Calheiros, será agora investigado pela polícia e pelo Ministério Público, também suspeito de corrupção e lavagem. Só falta mesmo a Presidente da República! E, pelo andar da carruagem, falta pouco... Quer dizer, a operação Lava Jato levou para a cadeia praticamente todos os envolvidos nas falcatruas da Petrobrás e nenhum deles é "peixe pequeno". Foram presas dezenas de pessoas, entre altos diretores da companhia, políticos e empresários. Quando ia-se imaginar que, no Brasil, políticos do alto escalão e donos de empreiteiras seriam presos antes mesmo de serem processados, julgados e condenados? Como diria um ex-presidente, "nunca antes na história desse país" se denunciou e se prendeu tanta gente influente e poderosa. Agora, a lista de presidiários inclui um senador e um banqueiro!
É sob essa perspectiva histórica que se deve analisar a prisão do senador Delcídio do Amaral e do banqueiro André Esteves. A democracia brasileira é jovem, mas, em menos de trinta anos de história, as instituições públicas já estão funcionando com grau de republicanismo suficiente para condenar corruptos, a exemplo dos mensaleiros, e colocar na cadeia pessoas que, por seu poder, antes eram intangíveis. Na história recente, todas as investigações que se fazia resultavam em "pizza", porque essas pessoas gozavam de uma espécie de imunidade de fato que as colocava acima da Lei e da Justiça. Hoje é diferente. Essas pessoas estão sendo investigadas, denunciadas e, inclusive, presas por ação da polícia, do Ministério Público e do Poder Judiciário. Foi-se o tempo em que só "ladrão de galinha" ia para a cadeia. Lógico que ainda há muito por fazer. Mas os avanços conquistados até agora devem ser celebrados, porque representam a consolidação do regime democrático e a afirmação da independência das instituições republicanas.
Em tempo (1): Algumas pessoas também não compreenderam a diferença entre a tragédia ocorrida na França e em Mariana. Criticaram quem, como o signatário, coloriu o perfil no Facebook com as cores da bandeira francesa. Por mais solidário que se queira ser com as vítimas de Minas Gerais - e ninguém em sã consciência deixaria de sê-lo -, não se pode comparar os eventos. Em Mariana, houve uma tragédia motivada pela irresponsabilidade de uma empresa e dos seus dirigentes. Um crime grave, mas um crime. Na França, houve uma série de atentados terroristas praticados por fanáticos religiosos, cujo alvo não era simplesmente as pessoas vitimadas, mas os valores que essas pessoas representavam. Os atentados atingiram a democracia, a liberdade de pensamento e de culto religioso, os direitos das mulheres e das minorias, enfim todos os valores cultivados e amadurecidos durante séculos no mundo ocidental. Por isso, quem coloriu o seu perfil com as cores francesas não o fez apenas em solidariedade às vítimas do velho mundo, mas principalmente para demonstrar que repudia qualquer ação terrorista que pretenda suprimir esses direitos e liberdades conquistados a duras penas ao longo do tempo.
Em tempo (2): Com o presente artigo, o signatário encerra essa coluna no corrente ano. Um feliz natal e uma ótima virada de ano para todos os estimados leitores! Até 2016!
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