O assassinato do
surfista catarinense Ricardo dos Santos, de apenas 24 anos, soma-se aos outros 56.325
homicídios ocorridos no Brasil, segundo dados do Mapa da Violência de 2012. Esse
número faz inveja ao mais fervoroso terrorista. Além das deficiências da
investigação (menos de 10% dos crimes de homicídio tem a sua autoria
identificada), outro fator que contribui para a escalada dessa barbárie é a lei
prever uma pena muito branda para um crime que é seguramente o mais grave, já
que atinge o bem de maior valor do ser humano: a vida.
O homicídio
simples, ou seja, aquele que não tem circunstância especial (como se o
assassinato de uma pessoa já não fosse algo extraordinário) sujeita o bandido a
uma pena mínima de 6 anos. O máximo é 20, mas a jurisprudência consolidou a
tese de que a aplicação da pena deve sempre partir do mínimo. Se for primário, o
matador começa a cumprir a pena no regime semi-aberto. E mais: por não ser
considerado um crime hediondo - apenas o homicídio qualificado o é - o condenado
(ou reeducando, no politiquês correto...) pode progredir para o regime aberto
após o cumprimento de apenas 1/6 da pena, isto é, um aninho. Quer dizer, mal
faz aniversário no presídio e já é liberado para passear de dia e só voltar à
noite para a cadeia. Isso nas localidades onde existem vagas para o regime
aberto. Em muitas comarcas, o regime aberto é cumprido mediante comparecimento
mensal ou semanal no cartório judiciário para assinar uma folha de presença. Se
o homicídio for "só" tentado, o agente pode pegar apenas 2 anos de
prisão, o que significa começar o cumprimento da pena no regime aberto.
Alguns crimes são
punidos com penas bem mais severas. A prática de qualquer ato libidinoso, por
exemplo passar a mão nos seios da mulher, hoje equiparado ao estupro, sujeita o
tarado a mesma pena mínima de 6 anos e é considerado um crime hediondo. Se a
vítima for menor de 14 anos ou vulnerável, a mínima sobe para 8 anos, mesma pena
prevista para a extorsão mediante sequestro – ambos considerados também crimes
hediondos e com regime inicial fechado. O tráfico de drogas, outro crime equiparado
a hediondo, é punido com, no mínimo, 5 anos. O roubo, um crime de natureza
patrimonial, sujeita o ladrão a uma pena mínima de 4 anos. Simplesmente possuir
em casa uma arma de fogo de uso restrito, mesmo sem fazer uso dela, já impõe ao
dono uma pena mínima de 3 anos.
Não se está dizendo
que esses crimes não mereçam essas sanções. A desproporção existe não porque esses
crimes têm uma pena severa. O problema está na pena do homicídio, que é muito
leve. Ora, apesar do trauma que outros crimes podem gerar, a vítima continua
viva e, bem ou mal, tem a chance de superar o abalo e seguir adiante. O
homicídio é irreversível. Daí porque é absolutamente incompreensível que o
sujeito que rouba um par de tênis seja punido com 4 anos, enquanto outro que
mata um cidadão receba apenas dois anos a mais de pena.
O assassinato não
faz vítima apenas a pessoa que foi morta, mas também todos aqueles que foram
privados da companhia dessa pessoa. Dá para imaginar a dor dos pais que
enterram os seus filhos assassinados? E o drama dos filhos que ficam órfãos
desde a tenra infância? E a saudade de irmãos, de amigos, enfim de todos aqueles
que eram próximos da vítima assassinada? Essas pessoas são atingidas de modo
indelével pelo resto dos seus dias. O que dizer do surfista Ricardo do Santos,
morto brutalmente aos 24 anos? Ele tinha uma vida inteira pela frente. Poderia
casar, ter filhos, estudar, trabalhar, surfar até quando sua saúde permitisse e
morrer de velhice, como se diz. Mas não vai poder fazer nada disso, porque a
sua vida foi abreviada de maneira estúpida. E o que vai acontecer com o seu
algoz? Talvez, em razão do motivo fútil ou outra circunstância específica, o
seu crime seja considerado qualificado e, por isso, pode pegar uns 12 ou 15 anos
de prisão. Mesmo assim, é pouco, muito pouco, já que tirou pelo menos uns 50
anos de vida da vítima, considerando-se a expectativa de vida no estado
catarinense. Depois de cumprir essa pena branda, com direito a progressões e
livramento condicional, o criminoso vai poder sair da cadeia e continuar
tocando a sua vida normalmente: brincar com os seus filhos, cuidar dos seus pais,
curtir os seus amigos, trabalhar, viajar, quem sabe até surfar. Enfim, vai
viver a vida que ele impediu a vítima de desfrutar. Definitivamente, isso não é
justo. Desculpem-me os defensores dos direitos humanos, mas o sujeito que mata
alguém deveria ficar preso para sempre, de preferência isolado. Assim, o
criminoso poderia passar o resto da sua miserável vida pensando no mal que fez.
Infelizmente, a
Constituição veda a prisão perpétua, e a lei penal fixa um limite de 30 anos de
prisão para qualquer crime. Desde a sua edição em 1940, o Código Penal sofreu
inúmeras alterações, assim como a legislação penal extravagante, criando-se
novos tipos penais e agravando-se algumas penas, de modo que atualmente a
legislação penal brasileira é uma verdadeira colcha de retalhos e necessita
urgentemente uma reforma completa. Enquanto essa reforma não chega, o
legislador poderia pelo menos corrigir algumas distorções graves, elevando, por
exemplo, o tempo máximo de prisão e a pena do crime de homicídio. O
encarceramento do criminoso por mais tempo certamente não vai trazer de volta a
vítima, mas pelo menos será um consolo para a família saber que o assassino do
seu ente querido passará mais tempo de vida preso do que solto.
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