Umas das principais promessas de campanha do presidente
eleito Jair Bolsonaro era reduzir os índices de violência e acabar ou, pelo
menos, diminuir a sensação de insegurança do cidadão. O tema é complexo, já que
são muitas as variáveis que contribuíram para a escalada da violência, como a
desestruturação das famílias, o sucateamento das polícias, a piora da educação,
o consumo de drogas, entre outros. Porém, o futuro ministro da Justiça, o
ex-juiz federal Sergio Moro, parece ter clareza de que o aumento da violência tem
relação direta com a impunidade. Por isso, umas das suas primeiras declarações
defendeu o aumento do número de vagas nos presídios. Ampliar o sistema
carcerário é uma ação fundamental para se combater a violência.
O bandido é igual uma criança pequena. Quem tem filhos sabe
como funciona. A criança, desde cedo, começa a testar os seus limites e a
paciência dos pais. Se os pais não agem com firmeza para coibir os excessos, a
criança desanda a fazer manhas para conseguir realizar os seus desejos,
transformando-se em um pequeno ditador doméstico. Por meio da educação, é
provável que a criança observe espontaneamente a maior parte das regras que lhe
são impostas. Mas se passar dos limites, a consequência é o castigo. Na minha
época, cortar a mesada, tirar o sorvete ou impedir o uso do videogame eram
meios bastante eficazes para inibir maus comportamentos. Mas o castigo mais
temido era, sem dúvida, ser proibido de brincar na rua! Vejam, desde a tenra
infância, o ser humano tem pavor de perder a sua liberdade! Pensar em passar o fim
de semana “preso” dentro de casa, em especial quando a previsão do tempo anunciava
sol e calor, soava como o fim do mundo, temor suficiente para me manter na
linha.
Essa coisa de explorar os próprios limites não é um desafio
restrito às crianças. Os adultos também tendem a ultrapassar gradativamente os
limites impostos pela convivência social para satisfazerem os seus próprios
caprichos. Baseado na minha experiência profissional, posso afirmar que o
delinquente não ingressa no mundo do crime cometendo infrações graves, mas sim
praticando pequenos delitos. À medida que percebe a falta de consequências para
o seu ato, o indivíduo se encoraja a praticar outros delitos, aumentando a
gravidade da sua conduta conforme aumenta a sua experiência de impunidade. Daí
porque a noção de castigo deve acompanhar o ser humano por toda a vida. Por
vezes, um castigo não muito severo será suficiente para conter os ímpetos do
sujeito. Porém, quando o indivíduo resiste conviver pacificamente com a
sociedade, não há alternativas, se não privá-lo da sua liberdade. E aí chega-se
em um dos mais graves problemas na segurança pública, que é a falta de vagas
nos presídios.
Nas últimas décadas, o quadro de superlotação das cadeias
públicas induziu, especialmente o Poder Judiciário, a uma política de
desencarceramento de presos para reduzir as tensões e as más condições de
habitação dos presídios. Desencarcerar é um eufemismo para uma política que
significa simplesmente devolver bandidos ao convívio social. Na gênese, a
teoria até era razoável, já que a ideia era soltar os criminosos menos
ofensivos para abrir vagas para os mais perigosos. Ocorre que, com o passar
tempo, os presídios passaram a abrigar somente os bandidos perigosos. Apesar
dessa constatação, a política de desencarcerar continua firme e forte, só que
hoje em dia solta-se um assaltante para abrigar um homicida; no outro dia,
solta-se o homicida para prender um traficante; no outro, solta-se o traficante
para colocar um estuprador; e por aí vai.
Essa política seria o mesmo que o sujeito tirar algumas moedas
do cofrinho cheio para colocar outras moedas. Ou, então, expulsar alunos da
sala de aula para abrir vaga para outros que estão fora da escola. É como enxugar
gelo. O que deveria fazer o poupador que já encheu um cofrinho e deseja continuar
poupando ou o administrador da escola lotada? Se ele não for daquele tipo que
tropeça na grama e sai pastando, evidentemente irá adquirir um novo cofrinho e
ampliar o número de vagas no sistema educacional. Ora, se os presídios estão
lotados, salta aos olhos que devolver o bandido ao convívio social não é a
solução. Ao contrário, livrar o bandido antes dele cumprir a sua pena só agrava
o problema, já que a impunidade estimula a pratica de novos crimes, aumentando
o número de clientes do sistema prisional, num círculo vicioso cujo resultado
está aí para quem quiser enxergar: bandidos soltos nas ruas e cidadãos de bem
presos dentro de casa. É como se o pai colocasse a criança de castigo na rua e
ficasse preso dentro de casa. Não faz nenhum sentido.
Argumenta-se que nos últimos anos a violência aumentou na
medida em que aumentou também a população carcerária, sugerindo-se maliciosamente
que o encarceramento é um fator associado ao aumento, e não à redução, da violência.
O argumento é falacioso, porque parte da premissa de que o indivíduo chega no
cárcere honesto e, no presídio, se transforma em um criminoso. Se a pessoa está
presa é porque, antes, cometeu um crime, ou seja, o criminoso antecede a prisão.
Para desespero daqueles que defendem bandidos, a verdade é que o encarceramento
é um mal necessário. Enquanto houver pessoas dispostas a cometer crimes, as
prisões têm que existir. Isso não significa eliminar outras políticas de
combate à violência, como a aplicação de penas alternativas para bandidos menos
perigosos. Mas até para que o criminoso sinta-se estimulado a cumprir essas
penas ele precisa ter no seu horizonte a expectativa de que, se não cumprir,
será privado da sua liberdade.
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